ti_a_u

quinta-feira, outubro 13, 2005

...a Dakar



Conforme prometido cá estou a dissertar sobre essas duas cidades, extremidades de tão conhecida viagem...

Na verdade, parece-me que o percurso deveria ser o oposto... mas talvez seja este o mais realista e aquele que nos ensina mais sobre a vida e as suas desigualdades e injustiças. Certamente que a prova automobilística nada tem a ver com as sensações que me levaram a reflectir e escrever sobre este tema, é apenas uma competição em que ganha aquele que primeiro chegar à meta, bem perto do "plateau"...

É incrível aquilo que as cidades e os seus espaços nos transmitem, por isso gosto de falar através delas. Paris é uma surpresa a cada esquina, a cidade do romance, do amor, aquela onde todos os sonhos parecem ser reais e onde nos permitimos imaginar a atingir a felicidade... Na "Cidade Luz" mesmo com a chuva que teima em caír sente-se a vida e o glamour; o pavimento preto das ruas com a água torna-se espelhado, reflectindo as copas das árvores e os "passeantes"... as lojas, os monumentos e as pessoas... um conjunto de estrelas cintilantes.

Em Dakar, nas ruas temos terra/poeira, no chão muito lixo, os passeios e as estradas em mau estado confundem-se como pavimentos esburacados, que apenas se distinguem por estar a cotas diferentes. Os edifícios estão maioritariamente degradados e as antigas vivendas coloniais que brilhavam no centro da cidade, foram demolidas e substituídas por edifícios de habitação de fraca qualidade... Passear é praticamente uma aventura tão cansativa como o próprio Paris/Dakar, dado que a cada esquina existem vendedores de tudo o que possamos imaginar.

No entanto, a cidade é detentora de algumas belezas e transmite-nos sensações contraditórias. Se por tudo o que disse poderiamos deduzir que era feia e perigosa, não é verdade... Nela encontramos alguns belos monumentos e paisagens deslumbrantes; e se um viajante bem ocidental (como eu) se conseguir integrar no espírito "Senegalês" vai descobrir pessoas muito hospitaleiras e prestáveis...

Parece-me que tal como referi no início, mais do que ser melhor ou pior... toda esta realidade se prende com desigualdades de vários níveis, desde o cultural ao económico e ao social... A verdade é que é mais fácil sermos atingidos pela tristeza e pela melancolia em Dakar do que em Paris... e é sempre mais fácil quando algo termina em alegria e festa!!!

4 Comments:

At 3:45 da tarde, Anonymous Anónimo said...

O que é ser un ocidental? Quando a própria ideia que temos dos outros também é uma construção " a priori" e ideológica. Não conheço Dakar e nem o percurso do deserto, mas sei que as cidades são todas invisíveis para os olhos que não querem ver: tu pelo menos viste uma Dakar que escapou aos preconceitos formulados pelo juízo alheio; seria essa postura de ver para além (allende)o motivo do viagem?

 
At 2:41 da tarde, Blogger ti_a_u said...

O motivo da viagem foi apenas o de fazer companhia a quem lá está a trabalhar, isolado deste mundo, a que estamos habituados. No entanto, procuro sempre que possível, ver as coisas para além do da primeira impressão...

"O que é ser um Ocidental?" ... Pergunta difícil, penso que cada um de nós terá a sua perspectiva e a sua resposta. Para mim é ser-se "consumista" e "comodista", é ter a qualidade ao virar da esquina, aceder a tudo sem dificuldade e saber que quase tudo se pode fazer sem sacrifício.

Ter-me-ei explicado bem? Talvez não, acho que a resposta vive em cada um de nós e difere de pessoa para pessoa.

Abraço

 
At 5:52 da tarde, Anonymous Anónimo said...

A pergunta foi uma provocação. Originalmente não era para ser dirigida a ti, mas a um escritor que disse "ser ocidental" num encontro onde estive. Não é fácil respondê-la, mas ao menos chegaste a formular alguns pontos. O consumo, o comodismo e a ausência de sacrifício são categorias muito discutíveis, Tiago, mas servem como ponto de partida. Os "ocidentais" julgam-se a partir de critérios como a democracia, o livre mercado e a laicidade num primeiro plano, e depois a cultura que se constrói tendo por base o cristianismo, no plano mais alargado. Mas, na minha opinião, um ocidental é uma fantasia de si próprio. Eu sou brasileiro, sou aquilo a que se pode chamar de cruzamento de civilizações; e gosto de ter uma fantasia sobre mim também, quero pensar que o meu lugar é o lugar nenhum: "não sou nem ocidental, nem coisa alguma, ou todas as coisas ao mesmo tempo".

Atravessaste o deserto? É uma experiência e tanto. Para alguns envolve algum aprendizado, para outros revela os limites. Eu já atravessei alguns deles, mas noutra esfera.

Um grande abraço,

 
At 9:40 da tarde, Blogger ti_a_u said...

Ah... aí estamos em desacordo. Eu adoro ser "ocidental" :-), pertencer aqui e possuir algumas das características, comuns aos povos que habitam o velho continente lol... já nem sei o que lhes hei-de chamar :-/

Quanto a travessias do Deserto, este ano fiz algumas... Que ano mais complicado, 2005!!! Mas nenhuma passou pelas areias e dunas dos desertos físicos do Planeta. Foram mais experiências de isolamento, reflexão e secura... morte em vida!!! No entanto posso dar-me por feliz, encontrei alguns oásis pelo caminho e encontrei um aeroporto que me trouxe de volta à velha europa e a casa.

Abraços

 

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